27 de julho de 2012

Pesquisa etnográfica: a juventude no projeto Fé e Café da Catedral Diocesana de Caxias do Sul


Trabalho realizado por Carina Rafaela de Godoi Felini
Disciplina Introdução à Antropologia
Relações Internacionais
                                                                       Faculdade América Latina Educacional


Introdução

A proposta de unir os jovens na Catedral Diocesana de Caxias do Sul para um debate bem humorado no qual se discutissem temas relacionados à fé e ao desenvolvimento social e pessoal foi proposta pelo padre Leomar; o apoio para sua operacionalização surgiu do grupo de jovens que participa ativamente na Catedral. Desta forma teve início a jornada do “Fé e Café”, um projeto formatado para que os jovens se encontrem para debater, socializar e, claro, beber café.
A pesquisa deste trabalho consiste em identificar como ocorrem as interações entre os jovens que participam do Fé e Café. Além disto, buscaremos mapear a faixa etária dominante nos encontros e as razões e motivações que levam os jovens a participar.

O programa Fé e Café

Desde março de 2012, no espaço Mater Dei da Catedral Diocesana de Caxias do Sul, um grupo de jovens se reúne para esclarecer dúvidas de espiritualidade e de vivência cristã na forma de um bate-papo chamado “Fé e Café”. Junto a eles, participa também o teólogo padre Leomar Brustolin, pároco da Catedral Diocesana de Caxias do Sul. Os encontros acontecem no último domingo de cada mês, às 20h, têm entrada gratuita e são abertos a todos os jovens. Como chamariz, haveria também música ao vivo - com a presença de diferentes bandas a cada encontro – e, claro, café à vontade.
O projeto foi idealizado pelo próprio padre e por jovens atuantes na igreja que buscavam respostas a temas como espiritualidade, fé, progresso social e amor ao próximo. Eles decidiram discutir estes temas em reuniões destinadas exclusivamente ao público jovem, nas quais estes próprios produziriam e apresentariam vídeos em que a sociedade poderia opinar sobre os assuntos em pauta.
Atuantes na Catedral, o casal Mariana Carrer e Vinícius Bacichetto receberam o convite diretamente do pe. Leomar para coordenar o projeto. Mariana conta o porquê decidiu aceitar “(...)como decidi fazer parte ativamente da religião católica faz pouco tempo, dois anos, tenho muitas dúvidas quanto ao pensamento do Igreja como instituição (e) sempre fui católica, fiz catequese, mas há coisas que nunca recebi explicação. Por este motivo acredito que não devemos opinar sem saber as explicações. Como quero opinar e ter certeza do que defendo e acredito decidi participar e organizar o Fé e Café.”.
Vinícius também afirma que decidiu organizar o evento porque “(...) o pe. Leomar solicitou para mim e para a Mari coordenarmos o projeto, este é o primeiro ponto, o segundo ponto foi que quando ele convidou eu achei interessante e topamos. Hoje, o que me motiva a ir é quando se trata de assuntos que eu acho interessante, tem assuntos que não acho, ai nem presto atenção, tem outros que são bem polêmicos e ai gosto de ir e participar (...)”
Primeiramente, podemos observar que o local no qual ocorrem os encontros é bastante agradável e acolhedor. O uso de almofadas coloridas com o logo “Fé e Café” e a presença de música ao vivo parecem descontrair o ambiente logo de entrada. Ademais, xícaras com café fumegante e biscoitos também atraem os participantes, alimentando-os e dando margem para que se travem novos conhecimentos. Como Vinícius Bacichetto relata: “(...) as bandas são diferentes, com repertórios diferentes, o que também se torna um atrativo e todo o ambiente é projetado para o encontro, com almofadas personalizadas, efeitos de luzes, puffs e tatames, tudo muito colorido para ter a cara do jovem.”
Destarte, os jovens parecem já se sentir em casa, ou mesmo num ambiente no qual estão livres a discutir os mais variados temas. Como adultos não participam, paira no local uma sensação de que nenhum assunto deve ser tratado como tabu, pois ali não estarão os “crescidos” para lhes fazerem sentir-se envergonhados. A exceção é pe. Brustolin, mas este é visto pelos jovens como um facilitador e não como um agente julgador. Além disto, a maioria dos jovens que participa do Fé e Café vêm aos encontros diretamente após a missa celebrada às 19h na Catedral, a qual o padre Brustolin preside.
O organizador Vinícius afirma que “o mais interessante é que mesmo acontecendo o encontro no meio de um ambiente católico, o projeto não é somente para participantes católicos, ele é aberto para todos os jovens entre 15 e 35 anos independente de sua religião e o objetivo é exatamente ir e colocar as opiniões adversas dos jovens, ou seja, não há necessidade de concordar com o que o padre fala, mas sim gerar um ambiente de diálogo e apresentar o que o pensamento da igreja.”
Este parece ser um ponto importantíssimo para o sucesso do Fé e Café pois os jovens apreciam muito a idéia de um bate-papo descontraído no qual não terão que se “converter” à opinião oficial da igreja católica se não quiserem. Em última análise, os encontros são uma catequese ao inverso, na qual os jovens não são catequizados, mas sim informados sobre um ponto de vista próprio da Igreja para, a partir daí, formaram sua própria opinião. Mariana explicita “(...) é extremamente inovador para uma igreja tradicional...(essa) interatividade, ou seja os temas são votados, assim você pode ajudar a construir o Fé e Café. E por fim, essa abertura que o padre Leomar oferece aos jovens de virem aos encontros e discutir diretamente com ele,  duvidar, questionar e até mesmo confrontar as idéias da Igreja. “
Um dos jovens idealizadores do projeto sempre abre a nova edição do Fé e Café apresentando o tema a ser abordado. Segue a apresentação de um vídeo - produzido pela comissão organizadora dos encontros – que mostra uma seleção de pessoas entrevistadas previamente sobre o tema em questão. Cabe notar que sempre há um elemento de humor nestes vídeos, fazendo com que os jovens presentes se divirtam e se sintam ainda mais descontraídos e desinibidos. No encontro cujo assunto era a visão da Igreja sobre o evolucionismo alguns membros da comissão organizadora imitaram macacos no vídeo!
A seguir, o padre Brustolin introduz o tema, que varia desde as Cruzadas e a Inquisição, os enigmas da criação e evolucionismo darwiniano ou mesmo sobre a existência do mal. Não importa o assunto, Brustolin fala com a propriedade de um teólogo experiente e conhecedor, e introduz aos jovens a visão da Igreja Católica. A partir de então, as perguntas e as opiniões passam a surgir e os jovens esperam para, cada um a sua vez, discutir.
Das vezes nas quais estive presente nunca notei intolerância entre as divergentes opiniões que tendem a aparecer. Os jovens se portam de maneira exemplar, nunca deixando que as divergências entre seus pontos de vista prevaleçam e arruínem o bem-estar geral e a satisfação que as questões respondidas durante os encontros oferecem. Parece haver uma consciência geral de que naquele espaço e momento, dentro de um espaço religioso dedicado a abertura do pensamento, deve-se deixar de lado ofensas, preconceitos e violência.
            A cada pergunta feita, o padre Brustolin busca mostrar qual enfoque a Igreja possui oficialmente sobre o assunto e abre espaço para que os demais jovens interessados em opinar publicamente o façam. O microfone é passado e cada um tem sua vez de falar. Sempre há momentos emocionais, nos quais surgem relatos ou vivências que os participantes desejam partilhar com o grupo. Ali, naquele momento, surge uma cumplicidade espontânea entre os jovens.
Em relação à faixa etária predominante, pude observar que a maioria dos jovens tem entre 18 e 25 anos de idade. Oficialmente, o Fé e Café pode abranger pessoas de 15 a 35 anos, mas me pareceu raro encontrar maiores de 30 anos presentes. Uma das razões é que os próprios organizadores do evento se encontram na faixa etária média de 25 anos e, uma vez que eles próprios estão entre os maiores incentivadores do projeto, parece óbvio que atrairão pessoal mais jovem.
Finalmente, depois de aproximadamente uma hora de discussões – o tempo determinado para os encontros do Fé  e Café - o pe. Leomar sumariza os pontos-chaves discutidos. Há sempre a insistência para que os jovens acessem o blog ou as redes sociais e votem no tema do próximo encontro. Mais um pouco de música e, com uma sensação de perguntas respondidas ou pelo menos trazidas à tona, os jovens deixam o espaço Mater Dei da Catedral Diocesana para voltar somente no final do mês seguinte.

Apontamentos finais

As atividades do Fé e Café são recentes, mas já atraem um número expressivo de jovens desejosos por conhecimento. A Igreja Católica, representada na forma da Catedral Diocesana de Caxias do Sul, tornou-se o meio através do qual os debates sobre espiritualidade, fé e comportamento acontecem todo final de mês.
É notável o empenho que a turma organizadora dedica aos encontros, criando um ambiente descontraído, inventando vídeos, realizando entrevistas e, notadamente, fazendo uso expressivo das mídias sociais para divulgar o programa. A iniciativa do padre Leomar foi muito bem recebida e levada à cabo com esmero.
O interesse pelos temas e a vontade de conhecer para poder se expressar com propriedade parecem ser as principais motivações dos jovens para participar. Durante os encontros o clima é amigável e descontraído, bastante adequado para a juventude, que age com naturalidade e desenvoltura ao questionar os dogmas da Igreja ou ao travar conhecimentos.


Bibliografia

KUSCHINIR, Karina. Eleições e representação no Rio de janeiro. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2000, PP 9-16 (introdução).
FÉ E CAFÉ CAXIAS. O que é. Disponível em http://feecafecaxias.blogspot.com.br/p/o-que-e.html  Acesso em junho 2012.


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